A italiana que transformou a mesa e os costumes da França
Por Edoardo Pacelli

Retrato de Catherine de' Medici (1519-1589),óleo sobre a tela por Germain Le Mannier, c. 1547-1559. Uffizi, Florence. Domínio público
Nosso interesse por Caterina de’ Medici nasceu depois de termos conhecido o livro de uma escritora italiana. De fato, já muito se sabe sobre Caterina de’ Medici, mas, graças a Marina Migliavacca, escritora e jornalista que gosta de dizer que há mais história para contar dentro de um prato típico do que dentro de um castelo, agora saberemos ainda mais. Em suas páginas, ela trata dos séculos passados, da sociedade e dos costumes. Aqui relatamos sua história sobre a rainha da gastronomia.
Caterina de’ Medici, a rainha gourmet
Os mais simpáticos a chamavam de Rainha Mãe, por ter dado à luz tantas cabeças coroadas; a mais crítica, de Rainha Negra — e não apenas pelo seu luto após a viuvez prematura. Todos os tipos de vícios foram atribuídos a Caterina de’ Medici, bisneta de Lorenzo, o Magnífico: supersticiosa, sedenta de poder, envenenadora …, Mas, além do grande debate sobre ela, o adjetivo que melhor lhe convém é certamente um muito mais feliz: gourmet. Uma nobre gourmet, vinda de sua terra natal, Florença, chegou à França aos 14 anos para se casar com o futuro rei, efetivamente “educando” a corte de Paris no que hoje chamaríamos de Made in Italy.
O casamento dela não foi por amor. Ela não era bonita nem muito nobre; era pequena, redonda e com olhos um pouco parecidos com os de um sapinho, típico dos Medici — a “lojista gorda”, como a chamavam. Além disso, durante os primeiros dez anos não pôde ter filhos, e seu marido tinha uma amante maravilhosa: Diana de Poitiers.
Mas Caterina tinha outras cordas em seu arco: era inteligente, culta e, acima de tudo, o que hoje definiríamos como uma criadora de tendências. Chegou à corte com cozinheiros e confeiteiros florentinos, toscanos e sicilianos que dariam o exemplo. Tinha curiosidade pelo paladar e sabia que sentar-se à mesa não significava apenas encher a barriga, mas também cercar-se de coisas bonitas. Ensinou os franceses a usarem o garfo, a perfumar as toalhas de damasco com trevo e meliloto, introduziu o guardanapo, fez com que se trocassem os pratos entre um e outro serviço, dividiu o doce do salgado… Não foram invenções suas, é claro, mas foi ela quem os tornou cotidianos.
Depois, há algo profundamente sentimental no fato de a jovem “italiana no estrangeiro” tentar encontrar, em seu prato, os sabores de casa e gostar tanto de vegetais — desde a sua querida alcachofra até os que considerava saudáveis (e até afrodisíacos), como chalotas, ervilhas e feijões, talvez temperados com óleo das colinas da Toscana.
O que ela não podia imaginar, ao fazer com que os cortesãos, cada vez mais conquistados, provassem delícias particulares, como sorvetes ou crepes, é que as receitas que importaria para a França teriam um destino curioso reservado a elas: fariam tanto sucesso que os chefs franceses as tomariam para si, a tal ponto que hoje todos pensamos que são originárias da França!
Do pato com maçã e laranja, que se tornaria canard à l’orange, à própria sopa toscana de cebola, que chamariam de soupe à l’oignon, passando pelo molho de cola rebatizado de bechamel, cria-se um curto-circuito cultural no qual Caterina também seria protagonista em muitos aspectos da vida cotidiana. Como, por exemplo, quando, para cavalgar com conforto sem causar escândalo, introduziu o uso de shorts longos por baixo da saia; ou, para superar sua baixa estatura, usou sapatos altos feitos por artesãos florentinos; ou ainda quando encomendou ao seu perfumista, Renato Bianchi — que se tornaria Mestre René, para os franceses — delicadas essências, inclusive as de giaggiolo ou lírio (iris, para os franceses), que não é outro senão o lindo lírio de Florença!
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