Entre as mudanças históricas que vieram à tona, está a crescente influência do poder econômico na política

Por Edoardo Pacelli

A situação do mundo diante da onda de tarifas desejada por Trump, vista, por exemplo, da Europa, é condicionada pelo fuso horário que alimenta o efeito de desorientação. Trump fala quando é noite na Europa. Acontece que o europeu vai dormir com um cenário e tem que perceber, ao acordar, que tudo mudou. Cada vez mais nós nos deparamos com antiamericanos ferrenhos, dispostos a dar crédito a Trump. Enquanto isso, dos amigos históricos da América vêm condenações irrevogáveis. As tarifas aumentaram a incerteza — não porque, infelizmente, haja alguma dúvida de que Trump pretende cumprir suas promessas de campanha, mas porque levará quatro ou cinco meses para entender o resultado de sua aposta. Haverá negociação ou não? Um passo parcial para trás? E qual será o impacto da tarifa, mercadoria por mercadoria, produto por produto?

No arsenal da antiga república de Amalfi, há uma preciosa coleção de bússolas.

Precisaríamos desesperadamente de uma dessas hoje, para determinar nossa relação com a América da era Trump. Uma ferramenta que ofereça alguns pontos de referência essenciais, para detectar perigos sem, no entanto, ter que mudar constantemente de rumo. Há, em especial, um ponto cardeal que jamais deve ser perdido: lembrar que a vitória do magnata, favorecida pelos erros de seus adversários, trouxe à tona profundas convulsões na sociedade americana — convulsões ativas há muito tempo. Portanto, o comportamento de Trump pode certamente ser considerado imprevisível, mas não fruto do acaso.

Entre as mudanças históricas que vieram à tona, está a crescente influência do poder econômico na política. As grandes empresas de tecnologia certamente não surgiram de improviso, tanto que, no passado recente, elas também apoiaram governos democratas. O que não tem precedentes é sua força, claramente superior à de muitos Estados — uma circunstância que nos leva a crer que o que está acontecendo na América é parte essencial de um desafio à democracia. Porém, mesmo neste caso, não estamos diante de uma novidade absoluta. A democracia, ao longo da história, foi dada como morta e enterrada em muitas ocasiões. O que há de novo, se é que há algo, é que isso está acontecendo no Novo Continente. E aqui o resultado antidemocrático é indicado como uma solução inevitável e benéfica. Hoje, de fato, a elite tecnocrática e libertária — de Peter Thiel, empresário estadunidense, cofundador do PayPal e da Palantir Technologies, investidor no Facebook e no Brasil, a Marc Andreessen, cofundador da Andreessen Horowitz ou a16z, um dos principais financiadores de capital de risco dos Estados Unidos — reivindica abertamente esse resultado para alcançar um governo imune à suposta lentidão e às ineficiências dos regimes democráticos.

A América de Trump, segundo a opinião de importantes economistas, pode, portanto, ser considerada o teatro de um choque entre “sedimentação institucional” e “ação individual” destinada a enfraquecê-la. O resultado, no entanto, está em aberto. Não há certeza alguma sobre como os eleitores americanos reagirão a essa tentativa. E não se deve esquecer que, nos Estados Unidos, as garantias do sistema democrático liberal residem, antes de tudo, na forma federal do Estado — que não garante que o que é decidido em nível central penetre automaticamente no corpo da nação. Essas poucas coordenadas devem, portanto, aconselhar-nos a evitar tanto as fibrilações diárias quanto as determinações teológicas daqueles que presumem saber como as coisas terminarão. O que é necessário é uma abordagem empírica e orientada, que não esconda a dificuldade do momento.

É muito provável que o mundo, depois de Trump, não seja mais o mesmo. É impossível, no entanto, prever qual será o papel dos Estados Unidos no novo cenário.